Merce Cunningham

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Breve Biografia

Merce Cunningham

Mercier Philip Cunningham nasceu em Centralia, Washington, em 1919. Teve seu primeiro contato com a dança aos 20 anos e neste mesmo ano foi convidado pela coreógrafa Martha Graham para dançar em sua companhia. Começava aí sua carreira na dança. Em 1939, se mudou para Nova Iorque como solista da companhia de Graham e a partir de então passou a contribuir fortemente para o desenvolvimento do que chamamos de Dança moderna. Cunningham, falecido em 2009, aos 90 anos, é um dos nomes mais importantes da história da dança e se destacou por sua ousadia e criatividade nas composições coreográficas. Ao lado de artistas de outras linguagens, especialmente do músico John Cage, com quem colaborou até sua morte, Cunningham apresentou ao universo da dança uma maneira totalmente nova de se criar (e olhar) dança.


Em 1953, Cunningham funda a Merce Cunningham Dance Company (MCDC), espaço para pôr em prática suas ideias originais e início de uma companhia que ficaria ativa até Junho de 2012, quando daria espaço a uma iniciativa ainda mais audaciosa, a Merce Cunningham Trust. Essa empreitada foi criada num plano de 3 anos, anunciada em 2009, e unificaria diversas iniciativas de memória, formação e continuidade da técnica e história de Cunningham, após sua morte. Uma forma de imortalizar sua obra e, ao mesmo tempo, centralizar seu patrimônio cultural. Mesmo após sua morte, a Merce Cunningham Trust continua a formar bailarinos nas técnicas desenvolvidos por este mestre da dança moderna, além de disponibilizar arquivos biográficos e bibliográficos para pesquisa sobre o artista. Em sua extensa carreira, Cunningham criou mais de 200 coreografias e colaborou com artistas diversos, músicos e artistas visuais, entre eles, Andy Warhol, Jasper Johns e Robert Rauschenberg, David Tudor, Christian Wolff. O trabalho de colaboração em outras linguagens também rendeu à Cunningham forte contribuição à Performance, ou performing arts.


Merce Cunningham Dance Company: Colaborações e Legado

A Merce Cunningham Dance Company (MCDC) foi criada em 1953, na Black Mountain College e incluiu bailarinos como Carolyn Brown, Viola Farber, Paul Taylor e Remy Charlip e os músicos John Cage e David Tudor. Em seus primeiros anos, a MCDC fez um tour que ficou famoso por ter sido realizado em um ônibus dirigido por Cage, com espaço apenas para 6 bailarinos, 2 músicos, um diretor de palco e o artista visual Robert Rauschenberg. Em 1964, a Cia fazia seu primeiro tour internacional, Europa oriental e ocidental, que seria uma virada em sua trajetória, pois abriria as portas para sua repercussão internacional.


A MCDC também foi um berço, de certa forma, para musica experimental. Segundo site oficial, o grupo foi responsável pela produção de trabalhos comissionados por compositores contemporâneos, maior que qualquer outra companhia. Sua produção inclui desde Christian Wolff a Gavin Bryers e Radiohead. John Cage, em sua colaboração de longa data, foi nomeado Conselheiro Musical até o ano de sua morte, quando foi substituído por David Tudor.


Também fazia parte da equipe da companhia a presença de um conselheiro de designer/ artes visuais, cargo ocupado inicialmente por Rauschenberg, seguido por Jasper Johns, Mark Lancaster, William Anastasi e Dove Bradshaw. Como colaboradores em trabalhos pontuais, podemos encontrar nomes famosos como o americano Andy Warhol e o brasileiro Ernesto Neto.


E na produção audiovisual, Merce Cunningham, considerado por muitos pesquisadores da área como “pai” da videodança, colaborou com os artistas Nom Nune Paik, Charles Atlas e Elliot Caplan. Entre suas obras de vídeo dança estão: “Life Time of Dance”, “Ocean”, “Split Sides”, “Beach Birds”, “Variations V”, entre outras.


MCDC


Todas as facetas artísticas de Cunningham e sua companhia, ao longo de uma vida dedicada às artes, em que a linguagem da dança se destaca, faz desse artista uma peça fundamental do pensamento e produção artística pós-moderna e contemporânea. O coreógrafo e bailarino deixou como legado uma “escola” de dança, o que inclui sua técnica e produção coreográfica, mas também seus arquivos de pesquisa, fotos, vídeos, videodanças, peças musicais e visuais,- um aglomerado cultural que atravessou seu percurso artístico e se estendeu para além dele.


Para além da Dança Moderna

Um dos aspectos mais instigantes da dança de Cunningham foi sua contribuição para o desenvolvimento da dança moderna, o que em sua produção também pode ser considerado como primeiros passos de uma dança chamada contemporânea (ou pós-moderna). Em suas criações, conforme entrevistas e estudos sobre o artista, estruturas coreográficas como narrativa e clímax perdem o sentido em prol da dança em si. Uma espécie de dadaísta da dança, Cunningham priorizava o movimento, as possibilidades que dele surgem e que a partir dele compõem frases coreográficas. A expressão desses corpos em movimento, a dança, ganha força em prol de narrativas mais tradicionais ou do sentimentalismo exarcebado, presença marcante da dança do pós-guerra.


Em processos de criação experimentais, Cunningham desenvolveu ao lado de Cage (um na composição coreográfica e outro na composição musical, respectivamente) uma vasta produção com base no “sorteio”. Fugindo totalmente da expressividade emocional, os movimentos criados em colaboração com os próprios bailarinos, são desenhados no tempo e espaço numa sequência sem lógica à priori, definida pelo sorteio, “by chance”. A mesma lógica é seguida para composição musical e esses dois aspectos de criação, ainda que componham uma mesma peça artística, são criadas de forma independentes e são colocados “juntos” apenas na montagem final. Os momentos fortes, tanto da música, quanto da coreografia, por não serem pré-definidos, não são também necessariamente encontrados. O trabalho de direção é ordenar as frases no espaço, imagens de grupos ou solos, repetições, pausas. O resultado é uma obra coreográfica visual, uma abstração em movimentos de dança, uma imagem, uma sensação, mas não um espetáculo.


Cunningham e Cage utilizam como referência antigas práticas de combinação, como o I Ching, oráculo chinês milenar que se vale da combinação de linhas na formação de 64 hexagramas, sendo cada um provido de uma simbologia e significado diferente. O acaso passa a ser o definidor coreográfico e os acentos fortes e fracos (que acontecem tanto na métrica antiga, quanto nas linhas dos hexagramas) são o pulso da coreografia.


A dança assim construída dá espaço para que o novo esteja sempre presente. As mais de 800 apresentações dos trabalhos chamados “Events” nunca se repetiam totalmente igual, tornando a “presença” a principal característica (ou estado de espírito) a ser trabalhada na criação e interpretação.


Events (1964)

Event: primeira performance 24/06/1964. Museum des 20. Jahrhunderts, Vienna, Austria

Merce Cunningham escreveu a seguinte nota para ser incluída no programa de Events:

“Presented without intermission, this Event consists of complete dances, excerpts of dances from the repertory, and often new sequences arranged for particular performance and place, with the possibility of several separate activities happening at the same time—to allow not so much [for] an evening of dances as the experience of dance.”

(tradução nossa: Apresentada sem intervalos, este Evento consiste em danças completas, extratos de danças do repertório, e por vezes novas sequências para arranjos criados para performances e lugares específicos, com a possibilidade de diferentes ações separadas acontecendo ao mesmo tempo – que permite não tanto [para] uma noite de danças quanto a experiência da dança.”


Um Event é acompanhado por música, não necessariamente associada à dança. Este formato foi criado para ser apresentado em espaços não tradicionais de palco/ teatro. A primeira apresentação de Event foi em Vienna, Áustria, no Museum des 20, em 1964. Um Event pode durar de 60 a 75 minutos, ou um MiniEvent pode durar de 20 a 40 minutos. Event também foi apresentado em performances em exposições de arte, como a RainForest, de Andy Warhol, ou Immerse, de Robert Rauschenberg.


Chance/ Acaso

Veja a entrevista feita em 1981, chamada “Chance Conversations”, em que Cunningham e Cage falam sobre a prática de composição com base no acaso:

Entrevista: Chance Conversations/ Merce Cunningham & John Cage


Há também um trecho do filme “Merce Cunningham: A Lifetime of Dance (2000)”, dirigido por Charles Atlas, em que o artista fala sobre o uso do procedimento do acaso:

“John Cage and I became interested in the use of chance in the 50's. I think one of the very primary things that happened
then was the publication of the "I Ching," the Chinese book of changes, from which you can cast your fortune: the hexagrams.
Cage took it to work in his way of making compositions then; and he used the idea of 64 — the number of the hexagrams 
— to say that you had 64, for example, sounds; then you could cast, by chance, to find which sound first appeared, cast again,
to say which sound came second, cast again, so that it's done by, in that sense, chance operations. 
Instead of finding out what you think should follow—say a particular sound—what did the I Ching suggest?
Well, I took this also for dance.”


John Cage e eu ficamos interessados no uso do acaso nos anos 50. Acho que uma das coisas mais primordiais que aconteceu na época foi a publicação do livro I Ching, o livro chinês das mutações, de onde você pode tirar sua sorte: os hexagramas. Cage adotou esse procedimento para trabalhar em suas composições; ele usou a idéia do número 64 – número de hexagramas – para dizer que você tinha, por exemplo, 64 sons; então você poderia escolher, por sorteio, qual seria o primeiro som a aparecer, sortear de novo, para dizer qual seria o segundo, e de novo, até que ficasse pronto, nesse sentido, por operações do acaso. Em vez de descobrir qual você deveria seguir – um som específico – o que o I Ching sugere? Bem, eu adotei esse procedimento também para dança. (Merce Cunningham in: ATLAS, Charles: 2001)


A Tecnologia na Dança de Cunningham

Outro aspecto importante a ser abordado, que não poderia passar em branco ao se tratar de Cunningham, é sua forte ligação com a produção da chamada arte tecnológica, da inserção de novas tecnologias em suas criações. Este destaque se dá não só por seu perfil de colaborações, atuando por vezes com outras linguagens e tecnologias, mas também pelo caráter experimental de suas obras.


Dessa forma, Cunningham foi considerado precursor desse movimento na dança e na arte em geral. O artista é considerado por muitos pesquisadores como autor da primeira Videodança, uma obra chamada “Westbeth”, produzida em parceria com o filmmaker Charles Atlas, em 1974. Mas já na década de 60, o artista experimentava em suas criações obras que misturavam linguagens de vídeo, som, movimento e aparatos eletrônicos.


Em 1965, Cunningham criou “Variations V”, que aleém de utilizar aparelhos eletrônicos no palco, ao lado de filme, bailarinos e outras intervenções, os dançarinos se movimentavam entre células fotoelétricas que emitiam sinais ao console dos músicos (John Cage e David Tudor), por onde os sons eram gerados.


Variations V (1965)

Uma grande peça “mídia-mix” envolvendo uso de filme e também, quando possível, de imagens de vídeo distorcidas pelo artista visual Nam Jun Paik. Uma série de antenas foram colocadas em torno do palco; quando um bailarino passava por um de seus receptores, um som era gerado, através da bateria de instrumentos eletrônicos operados por músicos da companhia. Células fotoelétricas foram colocadas nas bases dessas antenas, também para gerarem som a partir do movimento dos dançarinos. (David Vaughan)

Coreografia: Merce Cunningham. Música: John Cage. Arte: Nam Jun Paik. Primeira performance: 23/07/1965, Philharmonic Hall, Nova Iorque.

Variations V




Em 1991, Cunningham fez sua primeira experiência com softwares de computador, o primeiro programa utilizado foi o DanceForms. Os softwares de movimento tem como objetivo traduzir o movimento físico para linguagem de bits e bytes do computador. As imagens de movimento são capturadas por câmeras e sensores dispostos nos corpos dos bailarinos, que enviam os sinais para o computador, que através do programa específico, decodifica o movimento em linguagem de computador. Como colaboradores nessa investigação, Cunningham se associa a Paul Kaiser e Shelley Eshkar, com que dá forma a algumas criações, entre as mais famosas, a obra BIPED, de 1999.


Biped (1999)

Cunningham escreveu: “A dança me dá a sensação de troca de canais na TV... 
a Ação varia de sessões formais lentas a sequências rápidas fragmentadas, 
onde fica difícil de ver toda sua complexidade.”

(Tradução nossa, original: "The dance gives me the feeling of switching channels on the TV...the action varies from slow formal sections to rapid broken-up sequences where it is difficult to see all the complexity.")


BIPED


A cenografia de BIPED é uma exploração de possibilidades da tecnologia de animação do motion capture (captura de movimento). Os artistas digitais Paul Kaiser e Shelley Eshkar, em colaboração com Cunningham e dois bailarinos, coreografaram 70 frases de movimento que foram traduzidas em imagens digitais. Estas imagens animadas, bem como partes abstratas (linhas, pontos, sinais gráficos), são projetadas numa tela localizada na frente do palco, atrás da qual podem ser vistos dançarinos ao vivo. Também foi utilizado o software DanceForms, para desenvolver a coreografia para a dança, dividida em solos, duos, trios e grupos. A musica, assinada por Gavin Bryars, é apresentada parte em gravação, parte ao vivo. Efeitos de cenografia completam o clima tecnológico e transmitem efeitos especiais. (David Vaughan)

Coreografia: Merce Cunningham. Música: Gavin Bryars. Arte: Shelley Eshkar e Paul Kaiser. Primeira performance: 13/04/1999, Zellerbach Hall, Universidade da Califórnia, Berkeley.

Obras

  • Suite for Five (1956–1958)
  • Crises (1960)
  • Rainforest (1968)
  • Second Hand (1970)
  • Sounddance (1975)
  • Fabrications (1987)
  • CRWDSPCR (1993)
  • Ocean (1994)
  • BIPED (1999)
  • Split Sides (2003)
  • Views on Stage (2004)
  • eyeSpace (2006)
  • eyeSpace (2007)
  • XOVER (2007)
  • Nearly Ninety (2009)


Links Externos


Referências Bibliográficas

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