Dança do Marambiré
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TEIXEIRA, Lygia Conceição L. Marambiré: O negro no folclore paraense. Belém; Secult; FCPTN, 1989. | TEIXEIRA, Lygia Conceição L. Marambiré: O negro no folclore paraense. Belém; Secult; FCPTN, 1989. | ||
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+ | Grupo Sabor Marajoara. Entrevista realizada em junho de 2009 |
Edição de 23h42min de 22 de março de 2011
A dança do Marambiré caracteriza-se como um dos tesouros mais preciosos do folclore de Alenquer, município brasileiro do Estado do Pará. Foi introduzido no espaço às escondidas, por grupos de escravos refugiados de Santarém, estes localizaram-se às margens do Rio Curuá, onde desenvolveu-se um mocambo denominando-o de Pacoval. Trata-se também de uma manifestação de devoção religiosa onde mistura-se dança e música.
Segundo Loureiro:
“A dança é uma expressão cultural do antigo mocambo de Pacoval. Foi introduzido no município de Alenquer por pequenos grupos de negros, fugidos das fazendas de Santarém que localizaram-se às margens do rio Curuá, onde se constituiu em mocambo e que deram o nome de Pacoval. Durante muito tempo, esses negros evitaram contato direto com os brancos para preservarem suas crenças e seu sistema de vida. Mantiveram assim, uma integridade racial. Com a catequese dos missionários eles absorveram o cristianismo, se aproximaram lentamente da cidade de Alenquer e se estabeleceram em vários aldeamentos, com nomes de comunidades africanas. Nesse Vilarejo Pacoval era festejado o São Benedito, o Santo Preto da época dos Santos Reis, durante o qual os negros promoviam o Rezado, o Congado e o Marambiré.” (LOUREIRO, p. 152, 1995)
Na ocupação da Amazônia na cidade de Belém, por necessidades de subsistência, alguns portugueses que se encontravam na região, se encarregaram de trazer colonos para o desenvolvimento da mão-de-obra escrava, com o objetivo de um trabalho agrícola. No entanto, os colonos entraram em desacordo com os missionários, a ponto de não fazerem mais parte da atividade.
Assim, os conquistadores pensaram em utilizar a mão-de-obra escrava negra, junto com a dos indígenas. Porém, em relação aos índios houve a promulgação da lei de Provisão de 1º de abril de 1680, concebida pelo padre Antônio Vieira, que proibia o cativeiro dos indígenas. Todavia, dois anos depois houve a regulamentação que possibilitou o funcionamento de um comércio favorecido pelo monopólio da navegação, que introduziria durante vinte anos, dez mil escravos negros de quinhentos réis por ano, caso precisassem de muitos, poderiam ser vendidos a preço de cem mil. Desta forma, foi oficializada a chegada do negro na região Amazônica, possibilitando assim, uma grande influência ao folclore paraense.
Esses negros vindo da África, chegaram de imediato a Santarém, na casa de Maria Macambira, senhora de fazendas no município de Santarém. Contudo, por conta de tantos sofrimentos e torturas ocasionados pela escravidão, decidiram fugir da localidade. A autora Lygia Teixiera confirma essa afirmação quando diz que:
“Depois de longa e penosa viagem para atravessa o rio Amazonas até Monte Alegre; atravessaram o Maicuru, Igarapé do Inferno, nome dado por Maria Macambira, saíram terra a fora até varar no rio Curuá; como este rio estava seco, prosseguiram viagem alcançando o rio Culminá Panema, na cabeceira do qual fizeram suas malocas. Era o primeiro mocambo daqueles escravos e que recebia o nome de Mocambo de São Benedito, santo da devoção daquela gente.” (1989, pág 33)
Assim eles seguiram, atravessaram rios, passaram por secas do Curuá, até chegarem em um local decidido para formarem suas malocas (Casa pobre, esconderijos de pessoas.). Construíram então, seu primeiro Mocambo (moradia de aldeamento fixo,) denominando de São Benedito, por acreditarem no milagre deste santo ter proporcionado sobrevivência após a fuga. Dizem que para comemorar o fim do sofrimento da escravidão e as perseguições, eles festejavam agradecendo a São Benedito as promessas alcançadas.
Nessa região, eles se sustentavam do modo mais propício para a subsistência. Levaram roupas, um pouco de comida, caçavam, produziam algodão, pano, transitavam pela região encontrando tucum, tucumã, salsa, timbó. Entretanto, não havia para quem vender, então levavam para o velho Martins Beata, um chefe do Paraná, de cima de Alenquer, o único que realizava pequenas trocas dos materiais. Após a extinção da escravidão no Brasil, Martins disse para os negros saírem da região onde eles se encontravam que o mesmo iria os levar para Belém. Diante das dificuldades os negros se viram na necessidade de procurar uma novo abrigo e assim formou-se o segundo Mocambo em Pacoval, no município de Alenquer, com o nome de Santo Antônio, pois acreditaram nas possibilidades de melhores condições de vida.
Tabela de conteúdo |
Denominação Marambiré
Em relação ao significado Marambiré é difícil encontrar elementos concretos que denominam a palavra. Há hipóteses de que se trata de um título de nobreza da organização social dos negros. Há também a suposição de que surgiu a partir do nome “Meram do João Biré”, um grupo folclórico que se tem notícia. Mas que uma velha chamada Meram, companheira de João Biré, tinha um cordão parecendo de rezadores, que chamaram inicialmente de Merambiré e por conseguinte por regionalismos Marambiré, termo atualmente mais usado na região.
Em outros municípios como Óbidos e Alter-do Chão, citam a dança do Marambiré, entretanto é pouco o que se encontra, pois muitos não conhecem, não valorizam e descrevem mas como música popular e do que dança propriamente dita. Em Óbidos, o Marambiré é realizado todo ano nas localidades de “Silêncio da Mata”, contudo, há características diferentes do Marambiré praticado em Pacoval, posto que existe um interesse especulativo e não propriamente religioso. O que acontece é o que os pacovalenses denominam de “Festa de Ramada”, um festejo ainda praticado em várias localidades do Pará. A “Ramada” é um mastro de pau com comprimento de 5 a 8 metros, enfeitado com vários ramos significativos. Ele é transportado com o acompanhamento de pessoas que vivenciam tal prática e que contribuíram financeiramente para a brincadeira. Passa por várias ruas dos bairros e é fincado em frente a residência daquele que mais contribuiu para realizar o festejo do próximo ano.
A Dança
Segundo entrevistas com o grupo Para folclórico Sabor Marajoara, a dança do Marambiré veio junto com os escravos, que se instalaram em Pacoval. Referiram-se ao Marambiré como sendo um um reizado, uma folia de reis fazendo referências aos Reis Magos. Retomando ao lado histórico verificamos a consideração dessa afirmação.
Com relação a religiosidade, os negros acreditavam nas suas próprias crenças, eles tinham os seus orixás, todavia, quando vieram para o Brasil, a Igreja Católica não aceitava essa religião, uma vez que somente o catolicismo era predominante. Assim, para a mesma aceitar os negros diziam que os orixás eram santos, ou seja, nesse sentido eles enganavam a igreja católica para continuarem a cultuar aquilo que eles mais acreditavam.
Nessa dança é como se existissem dois marambirés distintos mas que sempre se conectam. O Marambiré de Pacoval considerado mais um ritual religioso em devoção aos Santos e o Marambiré de Santarém que é vista como uma dança de salão, tendo influência da corte portuguesa, europeus, ou seja, esta já sofreu diversas transformações no decorrer do tempo até formar-se uma coreografia de passos marcados que fazem referencia aos movimentos de origem realizados.
Na coreografia é apresentada vários personagens como:
Um Rei de Congo; Uma Rainha Mestra e mais auxiliares; Um Contramestre; Doze Valsares, sendo seis de cada lado; Tocadores;
A organização do espaço segundo Teixeira: é feita dentro de uma espaço imaginário, ao qual chamam de “Caixa Grande”.
“Tal espaço é estabelecido pela disposição em que se arrumam o Rei do Congo, as Rainhas, e os Tocadores; sendo que, embora também componentes do Marambiré, os Valsares ficam dispostos em duas filas de igual número de participantes, logo atrás da “Caixa Grande” e encerrando a arrumação do grupo fica o Contramestre.”(1989, pág 37)
Enredo da Dança
De imediato ocorre um ato litúrgico onde os moradores de Pacoval chamam comumente de “missa”. No entanto, não entra padre, nem pastor ou qualquer outro missionário. É o povo mesmo que se reúne na capela, e abrigam no altar as imagens de São Benedito, Santo Antônio e também os adereços, instrumentos dos participantes que serão retirados após o término da missa. É semelhante ao ritual católico, porém sem a comunhão. Teixeira diz que:
“Um dos presentes dirige e coordena os trabalhos e no momento destinado ao Sermão, este é substituído por uma interpretação por parte de quem desejar participar e discutir a respeito das três leituras bíblicas. Esta é a parte mais interessante do acontecimento, justamente por que o povo presente participa vivamente das discussões e com absoluto respeito as interpretações e opiniões apresentadas.”(TEIXEIRA,p.39, 1989)
Após a primeira parte, os instrumentos e objetos são retirados do altar ao som das batidas do bumboe e colocados em uma forma. Assim, eles cantam FORMA, FORMA, para se organizarem, porém ainda sem dançar. Em seguida, o grupo canta “Deus te salve” e logo após há o início da dança propriamente dita.
Começa a música “Atirei peça de Légua” que os próprios representantes cantam e dançam. É formada duas outras rodas uma pelo Rei e as Rainhas e a outra pelos Valsares e o Contramestre. Assim, começa a coreografia de passos marcados na música de ritmo bem alegre que anima o povo da região.
Indumentária
A indumentária abrange diversos detalhes que constituem verdadeiros símbolos do Marambiré. O traje do Rei é semelhante a dos oficiais-militares, porém todo branco. O casaco é adornado com talabarte de couro escuro. Usa botas brancas, com enfeites de prata. Na cabeça, coroas feitas de metal ou de fibra natural, dourado, em forma circular, cravejadas de pedras coloridas, de onde saem largas e multicores fitas de cetim que chegam ao chão. Sua copa e constituída por duas tiras em cruz. Esse detalhe da indumentária é o que Paes Loureiro chama de “Tiara do Marambiré” que faz referencia a Coroa do Marambiré que que uma peça marcante que os personagens utilizam.
“é uma peça de base circular que envolve a cabeça da testa à nuca. Na região frontal ergue-se um triângulo não vazado, com o cateto basilar ocupando longitudinalmente a testa inteira. A superfície desse triângulo é preenchida por tiras de arames ou papelão. Essa parte é triangular é toda recoberta, à semelhança do que acontece com a peça inteira, por minuciosa tecelagem ou dobradura de papel branco e colorido., geralmente vermelho e azul. Do ângulo superior do triângulo e de seus dois ângulos laterais de base, assim como da parte do círculo que envolve a nuca, a partir das extremidades da testa, pendem fitas coloridas.(LOUREIRO,p.154,1995)”
Essa tiara que o autor comenta é colocada à frente as imagens de São Benedito e Santo Antônio para reverenciar os Santos protetores. Além disso, a tiara do Marambiré serve para demostrar afetividade e respeito com pessoas desconhecidas que estão no local, além de simbolizar a história de existência, o tempo que se passou.
As Rainhas trajam vestido comprido, de seda em tons dourados, todo bordado, ajustado ao corpo. Usam mantos de veludo vermelho, bordados em pedrarias. Usam sapatos dourados ou pretos com bordado de pedraria. Ao redor da cabeça, também utilizam a coroa semelhante a dos reis de Congo, porém sem o cocar frontal em forma de bico e o grande penacho, apresenta pedaços de fitas coloridas de pano ou de papel agrupadas na parte de traz da coroa e ficam penduradas até o quadril. O traje dos vassalos imita a farda militar, sendo de cor clara com talabarte de couro escuro e enfeites de prata. Assim como os outros personagens também utilizam uma coroa formada por uma tira circular, feita de fibra ou metal, é enfeitada com pequenas tiras finas de papel de seda coloridas.
Na frente da coroa apresenta-se um cocar em forma de bico que se projeta verticalmente da base circular da coroa. E fica em cima de duas penas maiores e coloridas. E desse penacho saem diversas fitas também coloridas penduradas até o quadril.
Os vassalos executam um sapateado admirável. Carregam nas mãos um grande pandeiro todo enfeitado com fitas largas de cetim colorido e movimentam-no com mestria, fazendo belíssimas evoluções. Na vestimenta a mulher usa vestido estampado, justo na cintura e altura dos joelhos, com blusa de gola quadrada na frente e atrás, manga de três folhos bufantes e soltas com enfeites de renda na ponta dos folhos, saias também com três folhos e renda na ponta, arranjo de flores na cabeça e sapato social preto.
O homem veste calça comprida preta ou branca, camisa da mesma estampa do vestido da dama, gola e mangas compridas com três folhos na ponta da manga, sapato social preto. A dança inicia-se tendo à frente o Rei, a Rainha e a Princesa, lado a lado. Estes, cantam a parte do solo enquanto que os vassalos respondem movimentando-se diferentemente. O Contramestre se apresenta um avara um pouco mais de um metro, enfeitada com fitas coloridas presas às extremidades denominando-se “Varão do Contramestre”.
REFERÊNCIAS
LOUREIRO, João de Jesus Paes. Cultura Amazônica, uma poética do imaginário/Belém/ Cejup, 1995
TEIXEIRA, Lygia Conceição L. Marambiré: O negro no folclore paraense. Belém; Secult; FCPTN, 1989.
Grupo Sabor Marajoara. Entrevista realizada em junho de 2009