Eugenia Feodorova
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Apresentação
Eugenia Feodorova nasceu em Kiev, capital da Ucrânia, então uma das repúblicas da URSS, em 17 de outubro de 1923. Genia, como era chamada por seus amigos e familiares, sempre foi muito dedicada. Quando criança, era a mais levada das três irmãs. Aluna aplicada, sempre tirava boas notas e sempre se dedicara muito ao balé, que é sua maior paixão. Formada pela Escola Coreográfica Estatal de Kiev, teve sua promissora carreira interrompida pela Segunda Guerra Mundial. Veio para o Brasil em 1954, onde realizou trabalhos como mestra coreógrafa. Feodorova tinha uma vitalidade física impressionante. Quando pequena, durante o rígido inverno ucraniano com temperaturas que chegavam a menos 20 graus, saia de casa para ensaiar, mesmo com escolas fechadas e com o governo recomendando que todos ficassem em casa para não se expor as fortes nevascas que assolavam a cidade. Com o transporte público inoperante, Feodorova caminhava até a Escola Coreográfica Estatal de Kiev para ensaiar, sozinha e sem professora, e voltava da mesma maneira, a pé. No dia seguinte, ela acordava antes de todos de sua casa, sempre bem disposta e ansiosa pelas aulas de balé. Nunca ficava doente, e as únicas coisas que a impediram, de modo temporário, de exercer sua profissão, seja como bailarina ou coreógrafa, foram a Segunda Guerra Mundial em 1941, e uma artrose já no ano 2000, cujo qual ela sofreu operação e logo se recuperou. Feodorova fez também um curso de aperfeiçoamento no Kirov de Leningrado. Retornou a Kiev, começando a vida profissional como solista do Teatro Estatal. Seu inicio de carreira promissor, foi interrompido em 1941, quando Hitler e Stalin romperam o pacto germano-soviético que, até então, preservava a URSS do horror da Segunda Guerra Mundial, começada em 1939. Eugenia Feodorova, como vários de seus compatriotas, perdeu amigos, família e foi obrigada a trabalhar em campos de concentração, até abril de 1945, quando os nazistas debandaram diante do avanço do exército soviético. Sem saber que Kátia, uma de suas irmãs, havia sobrevivido junto com seu marido e seus filhos, refugiados da guerra, Feoderova sentia-se sozinha no mundo. Devido a todo terror que passou, e por acreditar que não havia mais ninguém da família lá, decidiu não voltar a URSS. Recomeçou a carreira com a Companhia Orlikovsky, sediada em Munique, na qual havia outros russos expatriados como ela. Tornou-se a primeira bailarina da companhia. Depois foi para a Bélgica, onde se tornou primeira bailarina da Ópera de Liége e professora da academia de Madame Alexeieva em Bruxelas. Depois, Itália, com o Ballet do Scala Milão, onde, além de primeira bailarina, trabalhou também como mestra coreógrafa da companhia, em turnê pela Espanha. Lecionou em Madri, na academia de Madame Taft entre 1952 e 1953 dançou e deu aulas em Paris. Durante sua jornada encontrou muitos compatriotas com os quais ela dividia histórias de muita luta e tristeza, histórias de pessoas, que assim como ela, foram sobreviventes da grande guerra.
Feodorova e o Brasil
Eugenia Feodorova chegou ao Brasil no dia 24 de agosto de 1954, a convite de Dalal Achar para ser mestra coreógrafa da companhia Ballet do Rio de Janeiro. A primeira impressão não foi das melhores. O país inteiro estava de luto pela morte de Getúlio Vargas, e Eugenia, que já não tinha certeza sobre a mudança, se viu ainda mais confusa e incerta sobre seu futuro. Tudo que ela sabia sobre o Brasil havia sido contado por Laura Proença, no estúdio de Olga Preobrajenska, em Paris. Laura havia exaltado o país dizendo maravilhas sobre o Brasil e seu povo, aliás, foi nesse mesmo estúdio que Feoderova conheceu Dalal Achar. Na manhã seguinte, primeiro dia de sol e Feodorova percebe porque o Rio de Janeiro tinha o título de cidade maravilhosa. Admirada com a visão que tinha da janela de seu apartamento em Copacabana, Eugenia Feoderova recuperou suas energias e começou a trabalhar. Desse dia em diante, seu endereço certo era na academia de Dalal, localizada em um casarão na Rua Saint-Romain, em Copacabana. Eugenia Feodorova diz: Desde o início a musicalidade do povo brasileiro me encantou. E, nesse aspecto, era como voltar à Rússia onde nasci e me formei, ou estar de novo na Espanha onde vivi e trabalhei, durante algum tempo, depois guerra. Brasileiros, russos, espanhóis têm a música e a dança no sangue. E, aqui no Brasil, havia também o calor humano, uma mistura de simpatia, gentileza, simplicidade, vontade de ajudar. Isso cativa o estrangeiro. Mas eu me surpreendi negativamente ao verificar qual era a situação dos bailarinos brasileiros: mal pagos, quase sem oportunidade de aparecer no palco, precisa trabalhar em shows de casas noturnas para se sustentar. A profissão nem era legalmente reconhecida. Essas pessoas mereciam apoio e respeito por sua abnegação, dando toda sua vida por um ideal de arte.
Quebra Nozes Completo
As aulas de Feodorova eram severas e fortes, requeriam muita dedicação de seus alunos, e davam aos mesmos uma base técnica sólida. Genia sabia como brigar e corrigir quando necessário, mas também sabia estimular os alunos a buscarem o melhor, suas broncas e incentivos eram distribuídos na justa medida. Outra coisa interessante é que, em suas aulas, Eugenia Feodorova não ensinava apenas os passos e a correta postura do balé, ela ensinava também todo o movimento cultural que o balé representava. De onde surgira, como surgira e o significado de cada passo ou movimento, uma verdadeira aula da cultura do balé. Em sua passagem pelo Brasil Eugenia Feodorova contribuiu muito para o desenvolvimento do balé no País. Em dezembro de 1956, a Companhia Ballet do Rio de Janeiro realizou sob comando de Eugenia Feodorova, o espetáculo Quebra Nozes completo, pela primeira vez no Brasil. Com exibição no Teatro João Caetano. O espetáculo teve curta temporada, porém com lotação esgotada em todos os dias e rendeu calorosos elogios da crítica à Eugenia Feodorova. Esse foi o sucesso inaugural da jovem companhia, e primeiro e único trabalho apresentado por Eugenia Feodorova como mestra coreógrafa da Companhia Ballet do Rio de Janeiro. Logo após o término da temporada do espetáculo Quebra Nozes Feoderova foi contratada como mestra coreógrafa pelo Theatro Municipal, e inaugurando também sua própria academia no Leblon.
O primeiro "Lago dos Cisnes" completo de toda a América.
“Ballet requer muito esforço físico. Assemelha-se ao trabalho de um estivador, só que enobrecido pelo sentido artístico.”
Eugenia Feodorova
Logo após assumir o Theatro Municipal do Rio de Janeiro, para desempenhar o trabalho de mestra coreógrafa em 1958, notou-se que o nível dos bailarinos e da companhia deu um grande salto. Em seu trabalho, Feodorova dava igual atenção aos solistas e ao conjunto, demonstrando respeito á todos e incentivando sempre o grupo a dar tudo de si para alcançar a perfeição. Feodorova estava preparando seus alunos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro para um feito histórico, a apresentação do primeiro Lagos dos Cisnes completo já visto em toda a América. Contando com o fatalismo de Tchaikovsky para demonstrar a luta entre o bem e o mal, a versão de Feodorova teve estréia em novembro de 1959, ano em que o municipal celebrou seu cinqüentenário. Outro grande feito de Feodorova e a companhia do Theatro Municipal foi a execução de O Galo de Ouro entre 1906 e 1907.
O descobrimento do Brasil e a Função Brasileira de Ballet.
Em dezembro de 1961 houve a estréia de O descobrimento do Brasil, com música de Villa Lobos. A peça retrata a história do descobrimento de nosso país. Com começo em Portugal, com a partida das embarcações, ilustrando a viagem dos portugueses e a chegada ao Brasil. Um romance que demonstra a tristeza na despedida dos portugueses à suas casas, a saudade, o medo, a incerteza e a irritação durante a longa viagem e, por fim, a felicidade e lisongeamento ao chegar ao Brasil.
Feodorova transferiu a sua academia do Leblon para Copacabana: uma espaçosa cobertura na Rua Santa Clara, de onde se avistava o Corcovado. Ali estabeleceu a sede da Fundação Brasileira de Ballet, entidade oficial, votada pela câmara, embora não recebesse apoio financeiro. A fundação juntava alunos e profissionais das turmas adiantadas que se apresentavam em diversos teatros cariocas e em turnês por várias cidades do país. O golpe militar de 1964 impediu que Feodorova criasse uma grande companhia nacional de dança, vinculada ao Ministério da Educação.
Prêmios, homenagens, títulos e conquistas.
•Medalha de Ouro da Associação de Críticos Teatrais (1958);
•Prêmio TV Tupi de Melhor Coreógrafa (1959);
•Troféu Nijinsky (1960);
•Prêmio de Melhor Coreógrafa do Estado da Guanabara concedido pela Secretaria de Educação e Cultura (1961);
•Convidada por Harold Hecht para ser coreógrafa do filme hollywoodiano Tara Bulba, que tinha como atores principais Yul Brynner e Tony Curtis, dirigido pó J.Lee Thompson e realizado pela United Artists (1961);
•Convidada para dirigir a temporada de balé da Ópera de Berlim, estrelada por Mais Plissetskaia (1974);
•Placa de Agradecimento de Ribeirão Preto (1975);
•Diploma de Honra da Universidade de Sergipe (1977);
•Medalha dos 70 anos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (1979);
•Placa de Homenagem da Academia Maranhense de Ballet (1979);
•Título de Carioca Honorária conferido pelo jornal O Globo (1981);
•Título de Cidadã Honorária concedido pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro (1989);
•Essas mulheres maravilhosas – Homenagem da TV Bandeirantes (1984);
•Medalha de Mérito Artístico da Dança do CBDD – Conselho Brasileiro de Dança, associado ao Conseil Internacional de La Danse da UNESCO (1986);
•Eleita vice-presidente do Conselho Brasileiro de Dança. Filiado ao Conseil International de La Danse da UNESCO, sediado em Paris (1980);
Fonte
Portinari, Maribel.
Eugenia Feodorova: A dança da alma russa
Maribel Portinari – Rio de Janeiro: FUNARTE: Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro, 2001
Série Memória do Theatro Municipal do Rio de Janeiro; 4.