Sweet & Tender Collaborations
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Histórico
O Sweet & Tender Collaborations é um grupo de artistas europeus, de países distintos, que se conhecerem durante um festival de dança de Viena, ImPulsTanz Festival, dentro do programa de residência DanceWEB, em 2006. Empenhados no mesmo objetivo de darem continuidade ao intercâmbio criativo que inauguraram durante a residência, criaram diversas ferramentas de articulação, entre elas um sítio virtual, Sweet & Tender Website
Na página principal do site há uma foto de cada artista e quatro opções de navegação: “website”, “blog”, “pictures” (fotos) e “current events” (eventos em andamento). A página do website tem uma característica mais institucional, como o histórico: “O que é o Sweet & Tender Collaborations?”, sua filosofia, estrutura, etc; os nomes de todos os artistas, os eventos já realizados e que ainda estão em processo e um arquivo de documento que é um dossiê do projeto “SKITe/Sweet & Tender Collaborations 2008 in Porto”. A opção “pictures” leva o internauta à página do grupo no “Flickr”- plataforma virtual de armazenamento de fotos – e a opção “blog” direciona ao blog do grupo, que está desatualizado, mas possui publicações importantes sobre o evento de 2008 no Porto, como, por exemplo, duas matérias jornalísticas que saíram nos principais canais de televisão de Portugal, RTP e RTPN, sobre o evento.
Em uma das matérias há uma entrevista com um artista integrante do grupo, Guilherme Garrido, em que afirma que a iniciativa do projeto é dos artistas, que se associam temporariamente com instituições culturais (governamentais ou independentes), para obterem apoio financeiro e de logística. É enfatizado, no entanto, que a gestão, criação e elaboração do projeto é de autoria dos próprios artistas. Esse tipo de articulação evidencia uma modificação na forma de prática artística da dança, que reflete nossa contemporaneidade.
Num primeiro momento, segundo Joana Martins, produtora do primeiro encontro realizado pelo coletivo após a organização na web, o SKITE Sweet & Tender Porto 2008, o grupo surgiu como uma alternativa à descontinuidade que ocorre nos programas de residência artística oferecidos por festivais, em que um grupo tem a chance de trabalhar junto por um determinado período, normalmente num caráter de imersão criativa, e ao fim do programa cada um retorna para sua cidade ou país de origem. Num segundo momento, com a formação de uma entidade que atua como uma estrutura única para diversas estruturas individuais, a articulação do grupo no espaço virtual é um meio de manter ativo o intercâmbio criativo e o contato entre artistas que têm como prática de criação transitar por diferentes programas de oficinas e residências, além do fortalecimento de cada projeto individual, a partir de uma iniciativa de grupo.
Devido às facilidades de trânsito entre países e entre projetos, no contexto europeu, e também levando em consideração a quantidade de festivais de dança novos que não param de surgir, os artistas do S&T Collaborations, que vivenciaram juntos um processo de criação colaborativa, criaram um grupo que continuasse ativo mesmo após o fim do festival. O objetivo dos artistas ao criar esse grupo - e a partir desse grupo, experimentar novas formas de integração, como a Internet, por exemplo - era garantir que as parcerias não ficassem restritas a um contexto de tempo e espaço definidos. E ainda, criar espaço para novas estruturas de pesquisa, criação e difusão que estão emergindo por toda parte na Europa. Por isso, a opção de eleger uma página na Internet, que centraliza as informações sobre o grupo e funciona como uma estrutura “física”, num espaço virtual.
Presencial – Virtual – Presencial
Além dos eventos presenciais, como o SKITe/ S&TC 2008, o grupo existe como uma vitrine dos projetos produzidos individualmente, centralizados na Internet. Não há, portanto, uma administração centralizada, mas uma rede de colaboradores, que tem a responsabilidade de iniciar e produzir projetos, na intenção que haja uma direção artística que funcione como alternativa aos meios tradicionais de produção cultural. A associação com a plataforma cultural SKITe, da França, em dois eventos seguidos, garantiu ao grupo suporte para uma atuação autônoma em relação às instituições culturais tradicionais (governo, produtoras, festivais), além da integração com outras linguagens, pois tem como conceito-chave a interdisciplinaridade estética. O objetivo do SKITe, associado ao S&T Collaborations, é possibilitar encontros e viabilizar projetos que fomentam uma nova estética e novos modelos de criação.
O grupo foi criado a partir de uma experiência presencial, passou a ser centralizado num espaço virtual, e mantém um processo contínuo de articulações que gera produtos como o evento SKITe/ Sweet & Tender Porto 2008, também presencial. Esse pode ser visto como um exempo de como as chamadas novas tecnologias, ou tecnologias digitais de comunicação, afetam a criação artística contemporânea. O pesquisador Fernando Gonçalves, em seu texto sobre tecnologia e cultura (2009), discorre sobre como a arte e a tecnologia se afetam mutuamente, transformando a forma de interação entre as mesmas. Em uma passagem de seu texto, Gonçalves afirma que o próprio uso da tecnologia pela arte não está fadado ao instrumental. Assim,
"Não é por acaso que para alguns artistas cabe hoje pensar a própria relação entre arte e tecnologia para além de uma perspectiva instrumental (tecnologia como ferramenta estético-expressiva). O uso da tecnologia na arte hoje poderá compor, por exemplo, espaços de ação coletiva ou de criação colaborativa à distância, onde fica mais clara a noção de arte como prática social e de comunicação." (Gonçalves, p. 105, 2009)
Dessa forma, o S&T Collaborations traçam um caminho (completam o ciclo) que parte do presencial, se apropria da tecnologia virtual e retorna ao presencial, sem ter que anular um coisa para que a outra exista. Melhor ainda seria dizer que o grupo é virtual e presencial, numa relação cíclica e contínua, de maneira simultânea, que pode ser associada à idéia de rede desenvolvida por Bruno Latour.
Para Latour, as expressões de nossa contemporaneidade podem ser observadas a partir da idéia de que não há relação hierárquica entre as coisas. Tanto as coisas humanas, como as não-humanas, separadas na modernidade em pólos extremos de sociedade e natureza, existem de forma híbrida: natureza-cultura. O processo de purificação ao qual o mundo vem sendo submetido pelos modernos, que Latour vai chamar de “crítica” não contempla mais as tramas interdisciplinares de nossa experiência atual. A rede é uma forma de compreender e “dar pátria” aos híbridos que se proliferam, e o conceito de tradução “conectaria em uma cadeia contínua a química da alta atmosfera, as estratégias científicas e industriais, as preocupações dos chefes de Estado, as angústias dos ecologistas” (Latour, 1994, p.16). Podemos dar enfoque às articulações do coletivo citado neste trabalho como um exemplo de tradução, que conecta diversos atores em uma mesma rede.
Nesse sentido, o que a rede virtual potencializa e evidencia é que as conexões investidas pelo ativismo artístico - realizado por agentes: coletivos, artistas, redes sociais, etc – podem ser também encaradas como práticas artísticas. As articulações realizadas pelo grupo S&T Collaborations ilustram uma rede, evidenciada e potencializada pela Internet, mas que já existe antes mesmo de ganhar o espaço virtual.
Colaborações doces e ternas
A iniciativa do S&T Collaboartions pode ser observada como um apontamento para novas formas de produção e a associação do grupo com parceiros temporários, encontrou no evento SKITe/ S&T Porto 2008 uma realização prática das articulações narradas neste trabalho. Num evento que teve a duração de 30 dias, na cidade do Porto, Portugal, o grupo favoreceu a criação de novas tendências para dança contemporânea, através da interdisciplinaridade e experimentação. Com residências, oficinas e mostras públicas, o evento pode ser encarado como um resultado prático de uma mobilização artística, numa atuação do artista também como ativista.
No caso do trabalho do S&T Collaborations, há uma intenção política em se organizar à parte das instituições culturais, e criar uma ordem de atuação que não fique submetida totalmente à lógica de mercado. Tommy Noonan, artista integrante do coletivo, conta como a criação do grupo passou também por uma decisão de organização alternativa em relação às práticas tradicionais, criticadas por ele como em permanente dependência de ambientes institucionais e de suas demandas em serem bem-sucedidos e alcançarem visibilidade (NOONAN, 2008).
A articulação feita por artistas para romper com a lógica do mercado é potencializada pela rede virtual que a internet possibilita. Para Noonan, o espaço virtual redimensiona a influência das grandes instituições de cultura e torna possível que projetos como S&TC possam emergir de encontros físicos, de forma independente, auto-organizada. Ele explica como a internet potencializa esta ação:
"A possibilidade de empregar simples sistemas operacionais de comunicação faz com que a construção de uma network seja mais fácil e mais rápida. Sistemas de base de dados podem ser compartilhados entre artistas – o intercâmbio de conhecimento, informação e contatos. Quando essa troca é baseada em relações reais de colaboração, como é o caso do Sweet & Tender, então este poderoso fluxo de conhecimento pode abrir possibilidades para a colaboração em espaço e tempo real." (NOONAN, 2008, s/p., tradução nossa)
O grupo opera com a ideia de que qualquer indivíduo que possa criar condições para sua própria produção e desenvolvimento artístico pode também criar espaço para outros. A ideia, segundo Tommy, é de generosidade, assim, a cooperação entre indivíduos pode combinar recursos para realizar um nível de acesso, mobilidade e crescimento, que não seria possível de outra forma, para cada membro individualmente.
Os projetos apresentados e desenvolvidos pelo grupo S&T Collaborations, atravessam estéticas, tecnologias e sociedade, apresentando em cada evento uma característica específica, como a ocupação de espaços públicos, não só os tradicionais. Pode ser um indício de um novo modelo de criação, que se baseia na idéia de troca e colaboração (entre artistas, produtores, órgãos públicos, etc), idéia em voga em nossa atualidade.
Referências Bibliográficas
- GONÇALVES, Fernando. Tecnologia e cultura: usos artísticos da tecnologia como prática de comunicação e laboratório de experimentação social. In Revista FAMECOS, PUC –RS, v.1,p.100-110, 2009.
- GORINI, Paula O. A Rede da Dança: uma cartografia em movimento. Dissertação defendida como requisito parcial para obtenção de título de mestre. Programa de Pós-graduação, Faculdade de Comunicação Social, UERJ. Rio de Janeiro, 2012.
- LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Rio de Janeiro: Editora 34, 1994.
- NOONAN, Tommy. Dis-Organization: Sweet and Tender Collaborations and the Possibilities of Loosely Coordinated Group Action. Istambul: 2008