Balé
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Balé
Balé (do francês Ballet) é o nome dado a um estilo de dança que se originou nas cortes da Itália renascentista durante o século XV, e que se desenvolveu ainda mais na Inglaterra, Rússia e França como uma forma de dança de concerto. As primeiras apresentações diante da plateia eram feitas com o público sentado em camadas ou galerias, disposto em três lados da pista de dança.
É uma forma altamente técnica da dança com o seu próprio vocabulário. Foi influente como uma forma de dança a nível mundial e é ensinado em escolas de balé ao redor do mundo que usam a sua própria cultura e sociedade. Os trabalhos de Balé são coreografados, e incluem também a mímica, atuação e são ajustados à música (geralmente orquestral, mas ocasionalmente vocais). É mais conhecido na forma de balé clássico, notável por suas técnicas, tais como o trabalho de pontas e das pernas, sua graciosidade, fluindo, movimentos precisos, e suas qualidades etéreas.
Etimologia
A palavra balé vem do inglês "ballet" que por sua vez está relacionada com a história sob a forma de arte. O balé da palavra vem do francês e foi emprestado para o Inglês por volta do século 17. A palavra francesa, por sua vez tem suas origens na balletto italiano, um diminutivo de ballo (dança). Ballet em última análise, remonta a ballare latim, que significa a dança.
História
A dança remonta a tempos imemoriais, manifestando-se em todos os povos em distintas formas. Na vida do homem primitivo, a dança presidia todos os acontecimentos – nascimento, casamento, morte, caça, doenças, visando a vida, a saúde, a fertilidade, através da comunhão com a natureza. Mas as suas formas posteriores superaram o sentido estritamente simbólico, como já se constatava no Renascimento quando a dança passa a ser ensinada por mestres, a serviço das cortes. As fontes deste movimento surgem no século XIV, da Itália para outros países da Europa. O primeiro ballet como espetáculo aconteceu em 1581, em Paris e, em 1661, o rei Luís XIV fundava a Academia Real de Ballet e a Academia Real de Música, confirmando o status de arte alcançado por ambas manifestações.
Origem do Balé
O balé nasceu na Itália. Originou-se das grandes procissões do Teatro Popular Religioso Medieval, onde se cantava e dançava a "canzone a bailo". O ballo, que até a Renascença ocupava as ruas, com a ascensão dos novos senhores aristocratas, imitando a chegada triunfal dos antigos Imperadores Romanos e com o significativo nome de "Triunfos" entrou nas casas renascentistas tendo como dança inicial a Mourisca. Num recinto fechado o grande baile de rua ficou menor, tornou-se um "balletto" isto é: pequeno baile. Desde então, tratadistas de dança deram início ao processo de sistematizar a dança cortesã. Na era do minueto surgiu o espírito sistemático do ensino do baile. Nesse sistema estava contido o método básico de um esquema de posições invariáveis da cabeça, do tronco, dos braços e das pernas que iniciavam e terminavam cada movimento. Nas posições básicas de pés propostas por Arbeau estavam compreendidas todas as possibilidades de combinar os passos para trás, para frente e para o lado, sem que se perdesse o equilíbrio. Atribui-se a disposição e aplicação das cinco posições de pés a Charles Louis Pierre Beauchamps, ainda que não se desconheça que elas são encontradas nos antigos gregos e até em povos primitivos.
Os balés da corte possuíam graciosos movimentos de cabeça, braços e tronco e pequenos e delicados movimentos de pernas e pés, estes dificultados pelo vestuário feito com material e ornamentos pesado. Quando a italiana Catarina de Medicis casou com o rei Henrique II e se tornou rainha da França, introduziu esse tipo de espetáculo na corte francesa, com grande sucesso. O mais belo e famoso espetáculo oferecido na corte desses reis foi o "Ballet Cômico da Rainha", em 1581, para celebrar o casamento da irmã de Catarina. Esse ballet durava de 5 a 6 horas e fez com que rainha fosse invejada por todas as outras casas reais européias.
O balé tornou-se uma regularidade na corte francesa que cada vez mais o aprimorava em ocasiões especiais, combinando dança com música, canções e poesia e atinge ao auge de sua popularidade quase 100 anos mais tarde através do rei Luiz XIV. Luiz XIV, rei com 5 anos de idade, amava a dança tornou-se um grande bailarino e com 12 anos dançou, pela primeira vez, no ballet da corte. Este rei fundou em 1661, a Academia Real de Ballet e a Academia real de Música e 8 anos mais tarde, a escola Nacional de Ballet.
O professor Pierre Beauchamp, foi quem criou as cinco posições dos pés, que se tornaram a base de todo aprendizado acadêmico do Ballet clássico. A dança se tornou uma profissão e os espetáculos de balés foram transferidos dos salões para teatros. No começo todos os bailarinos eram homens, que também faziam os papéis femininos, mas no fim do século XVII, a Escola de Dança passou a formar bailarinas mulheres, que ganharam logo importância, apesar de terem seus movimentos ainda limitados pelos complicados figurinos.
O período Romântico na Dança, após algum tempo, empobreceu-se na Europa, ocasionando o declínio do balé. Isso porém, não aconteceu na Rússia, graças ao entusiástico patrocínio do Czar. As companhias do ballet Imperial em Moscou e São Petersburgo foram reconhecidas por suas soberbas produções e muitos bailarinos e coreógrafos franceses foram trabalhar com eles. O francês, Mauris Petipa, fez uma viagem à Rússia em 1847, pretendendo um passeio rápido, mas também tornou-se coreógrafo chefe e ficou lá para sempre. Durante sua estada na Rússia, Petipa coreografou célebres balés, todos muito longos reveladores dos maiores talentos de uma companhia. Cada ballet continha danças importantes para o Corpo de Baile, variações brilhantes para os bailarinos principais e um grande pas-de-deux para primeira bailarina e seu partner. Petipa sempre trabalhou os compositores e foi Tchaikowsky que ele criou três dos mais importantes balés do mundo: a "Bela Adormecida", o "Quebra-Nozes" e o "Lago dos Cisnes".
Mas chegara o momento para outra linha revolucionária, desta vez por conta do russo Serge Diaghilev, editor de uma revista de artes que, junto com amigos artistas estava cheio de idéias novas pronta para colocar em prática. São Petersburgos porém não estava pronta para mudanças e ele se decidiu por Paris, onde começou por organizar uma exposição de pintores russos, que foi um grande sucesso. Depois promoveu os músicos russos, a ópera russa e finalmente em 1909 o ballet russo. Diaghilev trouxe para a audiência francesa os melhores bailarinos das Companhias Imperiais, como Ana Pavlova, Tamara Karsaviana e Vaslav Nijinsky e três grandes balés sob direção de um jovem brilhante coreógrafo Mikhail Fokine, a quem a crítica francesa fez os melhores comentários. Os russos foram convidados a voltar ao seu país em 1911 e Diaghielev formou sua própria Companhia, o "Ballet Russo", começando uma nova era no ballet.
A Reforma na Dança
Em 1754, Luís de Cahusac foi o primeiro a criticar o excessivo apego à forma e não ao conteúdo da dança. Ele era um famoso libretista (que constrói o libreto, a história da peça), historiador, e, principalmente, crítico. Para ele, qualquer manifestação artística servia para imitar a vida real, e por isso a dança deveria ser uma forma de se expressar com o corpo as intempéries da alma. Franz van Weuwen Hilferding, um bailarino austríaco que estudou na França, se tornou maitre de ballet em Viena, Stuttgart, e São Petersburgo, onde produziu ballets repletos de ações, mímicas e mise-en-scenes. Mas esses balés ainda não constituíam uma ação completa, eram um aglomerado de historietas que juntas não tinham sentido algum. O principal nome da reforma é Jean Georges Noverre.
Conhecido por sua insatisfação com a dança e as regras de sua época, ele estudou dança mas não entrou na Academia Real, como ditavam as regras. Começou, então, a viajar de um lugar para outro, primeiramente como bailarino, e logo coreografando peças e espetáculos. Com 27 anos já era um maitre de ballet de renome, espalhando suas idéias inovadoras por onde passasse e influenciando toda a Europa. Dessa forma, depois de muito viajar por todo o continente, foi finalmente nomeado Maitre de Ballet da Academia Real de Paris (contra a vontade do corpo de baile e dos tradicionais, porque esses acreditavam que só alguém que já foi bailarino da Academia poderia ser maitre da academia). Lá, ele criou poucas peças em virtude da falta de apoio por parte dos bailarinos, mas talvez uma delas seja a mais inovadora de sua carreira: "lês Caprices de Galanthée", em 1781. Não continha canto, mas apenas danças e mise-em-scenes. Foi o primeiro ballet a romper definitivamente com o estilo das óperas. Noverre criou, assim, o ballet que girava em torno de uma só ação dramática, que contava uma história, síntese do Balé de Repertório. O mestre acreditava que, antes de ser uma manifestação estética, a dança era uma forma de se exprimir emoções com o corpo. A estética do movimento era apenas uma consequência da emoção que brotava na alma do dançarino. Os bailarinos não poderiam deixar de lado a técnica, mas esta não era, de forma alguma, mais importante que a emoção que a dança busca exprimir.
Noverre insistia muito no endehors, mas para ele nada deveria ser forçado: a abertura do quadril seria trabalhada através de exercícios como os rond de jambs e grand battements. Ele ainda criticava os bailarinos de sua época por trabalharem excessivamente o corpo e pouco a alma, tornando-se ignorantes na arte expressiva. Para ele, o bailarino deveria dividir seu tempo igualmente entre os estudos da arte dramática e as aulas para o corpo. Noverre criticou fortemente as vestimentas que cobriam os bailarinos: para ele, tudo deveria facilitar a técnica e principalmente a expressão no desenvolvimento da trama da história de cada balé. Por isso, ele também retirou as máscaras de cena: "O rosto é o órgão da cena muda, é o intérprete fiel de todos os movimentos da Pantomima (dança expressiva), é o suficiente para banir as máscaras da dança".
Em 1789, um discípulo de Noverre, Jean Dauberval, foi para Bordeaux, seguindo uma bailarina que amava, mas que não se dava bem com a direção da Ópera de Paris. Em Bordeaux, Dauberval criou "La Fille Mal Gardée", o mais antigo balé dançado até hoje. Quase nada de sua coreografia original foi mantida, mas sabe-se que era um ballet alegre e impregnado dos ideais da Revolução Francesa. Nasceram assim os Balés de Repertório, que vêm sendo dançados e adaptados até hoje, e nos quais a ação dramática deve ter início, meio e fim, representados a partir de danças e mise-en-scenes. O mestre Noverre transformou o balé clássico em uma dança que não se limitava a uma execução mecânica, que foi capaz de emocionar pessoas em todo o mundo nos séculos seguintes.
Os Balés Românticos
O Romantismo do século XIX transformou todas as artes, inclusive o balé, que inaugurou um novo estilo romântico onde aparecem figuras exóticas e etéreas se contrapondo aos heróis e heroínas, personagens reais apresentados nos balés anteriores. Foi nesta época que os Balés de Repertório se firmaram.
O Romantismo foi um movimento artístico de valorização do sentimento em detrimento da razão (como desejava o mestre Noverre) e no qual a imaginação era deixada à solta, sem qualquer controle ou auto-censura. Dessa forma, a dança que expressa algo, que mostra sentimento, cresce notoriamente, sem deixar morrer o imenso desenvolvimento técnico que havia acontecido anteriormente. No momento, o que se buscava através da técnica eram formas expressivas, a poesia do corpo, a fluidez da dança e não o virtuosismo e a beleza das formas.
Esses novos ideais, baseados na "Igualdade, Liberdade e Fraternidade" da Revolução Francesa, se afastam totalmente dos ideais estéticos greco-romanos. Os artistas tendem a se inspirar no seu cotidiano, nas suas emoções reais, e não na idealização da perfeição dos Deuses.
Uma das grandes inovações da Era Romântica foi o surgimento da dança na ponta dos pés. Eis um bom exemplo dos ideais românticos: houve um imenso desenvolvimento da técnica, mas os objetivos desse desenvolvimento vão muito além da estética da forma: na ponta dos pés, a bailarina se torna muito mais leve e expressiva, pelo menos aos olhos do espectador. Com as pontas, surge a supremacia feminina no balé: os bailarinos agora serviam de suporte, para apoiar e levantar as grandes estrelas. Para isso, eles deviam ser fortes, e belos e expressivos para as histórias de amor. A dança agora se torna mais sensual (para os padrões da época): para equilibrar a bailarina na ponta, o partner deveria ampará-la com seu corpo ou ao menos segurá-la pela cintura.
Nesse clima, em 1832, nasceu "La Sylphide". Foi o primeiro balé já coreografado para as pontas e o primeiro grande balé romântico. Retratava um dos tema preferidos do romantismo: o amor entre mortais e espíritos, e inaugurava a imaginação sem fim, que tratava de temas cotidianos somados a seres como ninfas, duendes, fadas e elfos. Mostra uma grande preocupação com imagens sobrenaturais, sombras, espíritos, bruxas, fadas e mitos misteriosos: tomando o aspecto de um sonho, encantava a todos, principalmente pela representação da bailarina que se movia no palco com inacreditável agilidade na ponta dos pés, dando a ilusão de que saía do chão. Os Deuses do Olimpo (gregos e romanos) estavam quase esquecidos.
As roupas brancas e longas das ninfas, quase sempre com fartas saias de tule com collants, acentuavam o corpo das bailarinas, o que contribuiu para a sensualidade e para a necessidade de se lapidar ainda mais a técnica, pois agora o corpo aparecia mais (as saias de tule são um pouco transparentes) e não era mais tão disfarçado pela roupagem. Nesses mesmos moldes, o balé "Giselle" estreou em 1841, sendo remontado mais tarde pelo menos duas vezes. Assim como "La Sylphide", "Giselle" apresentava um 1º ato realista, entre os camponeses, e o 2º ato mais fantástico. Ao invés das ninfas apresentadas no primeiro balé, no segundo ato de "Giselle" surgiram novos seres imaginários, as Willis, que eram como ninfas más. Dos grandes nomes da primeira metade do século XIX, "La Sylphide" lançou Maria Taglioni, este balé foi criado para ela, a mais perfeita bailarina romântica, harmoniosa, que parecia flutuar, portadora do tipo físico ideal ao romantismo. "Giselle" lançou Carlota Grisi, uma mulher com uma interessante história pessoal, inspiradora do balé: foi profundamente amada por Julius Perrot, o coreógrafo do balé, com quem viveu, e também foi musa inspiradora do Libretista dessa obra, Theóphile de Gautier, que morreu balbuciando seu nome. A segunda bailarina que estrelou Giselle foi Fanny Elssler, muito conhecida por seu estilo forte e voluptuoso. Este balé romântico representa o maior de todos os testes para a bailarina até os dias de hoje.
Balé Clássico
O Ballet Clássico, ou Dança Clássica, surgiu numa época de intrigas entre os Balés Russo e Italiano, que disputavam o título de melhor técnica do mundo. Sua principal função era expremer ao máximo a habilidade técnica dos bailarinos e bailarinas e o virtuosismo que os passos de balé poderiam mostrar e encantar toda a platéia. Um exemplo deste virtuosismo são os 32 fouettés da bailarina Pierina Legnani em "O Lago dos Cisnes". Esses Balés também se preocupavam em contar histórias que se transformaram basicamente em contos de fadas. Procura-se sempre incorporar seqüências complicadas de passos, giros e movimentos que se adaptem com a história e façam um conjunto perfeito. No Balé Clássico a roupa mais comumente usada eram os tutus pratos, sainhas finas de tule, marca característica da bailarina, pois permitiam que as pernas da bailarina fossem vistas e assim ficasse mais fácil verificar se os passos estavam sendo executados corretamente. Como exemplos, "O Lago dos Cisnes" e "A Bela Adormecida".
A dança pela Europa
O romantismo marca também a queda da dança francesa. Nessa época, os grandes nomes, sejam coreógrafos ou bailarinos, circulavam por toda a Europa, e principalmente por São Petersburgo e Viena. Na Ópera de Paris nada de esplendoroso aconteceu, a não ser da criação de "Le Corsaire", de Mazilier, em 1856, e "Coppélia", de Arthur Sait-Leon, em 1870.
As bailarinas italianas espalhavam uma nova "moda": a dança mais acrobática, mais voluptuosa, como a de Fanny Elssler. Na Rússia, a monarquia dos Czares incentivava e investia na dança, como forma de mostrar seu poder e grandiosidade. Tal situação atraiu talentos de toda a Europa, que fugiam do mercantilismo e da conseqüente falta de investimento na dança.
O Neoclassicismo na dança
Nijinsky e Pavlova
A partir do início do século XX, a influência do balé russo se espalhou por toda a Europa. A grande expansão da dança russa se dá com Diaghilev, um amante das artes que organizou uma espécie de "grupo itinerante", que apresentava os ballets russos por todo o mundo. Com Diaghilev trabalharam alguns dos maiores nomes do século XX:
Michel Fokine (coreógrafo de Les Sylphides), Anna Pavlova, Nijinsky (grande bailarino e autor de peças como A Sagração da Primavera) e Balanchine (também coreógrafo e fundador do New York City Ballet).
Diaghilev acreditava que a dança deveria ser o encontro de todas as artes, e por isso os cenários das peças de seu grupo costumavam ter assinatura de grandes nomes, e as músicas eram de autoria dos novos talentos como compositores, como Stravinsky. Isso tudo sem contar com inovações como a valorização do corpo de baile, que então deixou de apenas figurar, ganhando mais números e destaque. Enfim, foi graças a Diaghilev que a força da dança ressurgiu no ocidente, chamando a atenção do público (porque suas peças eram sempre ricas ou polêmicas) e dos novos talentos que surgiram a partir de então. Era uma nova dança: extremamente virtuosa, com um toque de poesia, modernidade e inovação.
Nessa mesma época, um grupo sueco causa grande polêmica. Interessados em romper com as tradições, em 1920 Rolf de Maré e o coreógrafo Jean Börlin fundam um grupo cuja maioria provinha da Ópera Real de Estocolmo. Os suecos passaram 5 anos espalhando sua polêmica na Europa, participando da extraordinária criatividade de sua época e transformando o balé em uma arte contemporânea. Suas peças mais marcante foram "La Création du Monde", em 1923 e "Relâche", em 1924, sendo que esta última foi a primeira peça de ballet que utilizava cinema (o filme entre'acte, de René Clair). Sendo assim, os suecos foram responsáveis pela introdução do cubismo no balé, utilizando até um cenário de Picasso no ballet Icaro.
Em 1925, não aguentando as pressões que sofriam, por problemas e contradições de sua arte (a técnica acadêmica clássica ainda era utilizada, com toda a sua rigidez, apesar de toda a maleabilidade de suas idéias, cenários e histórias) o grupo se dissolveu. Foi assim que a dança, ainda clássica, incorporou os ideais modernos. Através desses grupos, das concepções coreográficas de Balanchine, Fokine e Nijinsky, de bailarinas revolucionárias e marcantes como Anna Pavlova. As primeiras décadas do século XX se dividiram, assim, entre o brilhantismo acadêmico russo e as inovações dos grupos (russo e sueco) que percorreram o ocidente.
Vídeo de Anna Pavlova em "Swan Lake" - O lago do Cisne
No Brasil
No Brasil, o balé clássico teve seu primeiro impulso significativo quando das visitas ao país de companhias internacionais de renome, como a de Diaghilev (1913 e 1917) e Ana Pavlova e seu corpo de baile (1918 e 1919). Neste período, Maria Olenewa, solista de Pavlova, permaneceu no Rio de Janeiro, pretendendo introduzir o ensino do ballet clássico em moldes avançados. Este objetivo foi alcançado efetivamente em 1927, ao ser criada uma escola de bailado sob sua direção no Teatro Municipal. Em 1930 a escola foi oficializada e surgiu o Corpo de Baile do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em 1937 foi contratado o coreógrafo e maître de ballet Vaslav Veltchek, outro mestre competente que haveria de consolidar definitivamente a obra de Oleneva. Porém, antes deste fato, em 1927, no Estado do Paraná, Tadeuz Morozowicz criava a primeira escola de Ballet do sul do Brasil. A Escola funcionou na Sociedade Thalia, em Curitiba.
Na década de 1930, talvez devido à ameaça e conseqüente eclosão da 2ª Guerra Mundial, houve uma migração de profissionais europeus para o Brasil, em particular para o Rio de Janeiro, maior centro cultural do país, à época. Vindos de países onde a ginástica e o ballet estavam em fase de mútuas influências, alguns destes profissionais imigrantes acompanharam o modelo de “academia” introduzido com sucesso por Naruna Corder desde 1925. Nas décadas de 1930 e 1940 as academias tanto de ballet per se, com este associado à ginástica floresceram no Rio de Janeiro, concentrando-se no bairro de Copacabana, destacando-se as de ballet clássico de Ana Baliska, russa; de Emma Vargas, húngara; e de Pierre Michailowsky e Anna Grabinsky, russos.
As Escolas
Pode-se definir “escola”, no sentido artístico, como determinada concepção técnica e estética de Arte seguida por vários artistas, ao mesmo tempo. As bases da dança clássica são universais, ainda que as diferentes escolas adotem enfoques diferentes e diferentes designações para seus diversos movimentos e exercícios. Exemplificando, Vaganova adota quatro arabesques no seu método, enquanto que a Royal Academy of Dancing adota três. A preservação do francês como o idioma do ballet impediu que essas diferenças destruíssem a universalidade de seu ensino. Independentemente do número de arabesques adotados, todos os bailarinos sabem o que é uma pose chamada arabesque. O 1º arabesque, inclusive, é igual em todas as escolas.
A Escola Italiana
Seguindo sua própria tradição, a Itália continuou, até o final do século XIX a produzir grandes maestros de dança. Eles não só originaram o que se convencionou chamar de "Escola Italiana de Ballet", muito bem representada por Carlo Blasis e Enrico Cecchetti, como exerceram notável influência em todas as demais escolas: francesa, dinamarquesa, russa, inglesa, norte-americana e, mais recentemente, na cubana.
Pode-se admitir que todos os preceitos de um moderno método de ensino estão contidos no seu “Traité elementaire theorique et pratique de l"art de Danse – Tratado elementar teórico e prático da arte da Dança”: do porte à harmonia e coordenação dos braços, do paralelismo dos exercícios a seu aspecto perpendicular e vertical, do equilíbrio ao ligeiro abandono sugeridos para arabesques e poses onde o rosto deve, contudo, manter a vivacidade e a expressividade, do plié às piruetas, do adágio ao allegro.
Para Blasis, o adágio representava o cume da arte de um bailarino. Através dele, Blasis classificou os bailarinos em: trágico, o bailarino nobre de hoje, viril, majestoso, sóbrio, refinado e esteticamente associado às imagens de Apolo ou de Antínoo; e em demi-caractére, o bailarino talhado para danças características, campestres, rústicas, satíricas, onde ele admitia uma figura mais atarracada.
Conhecedor de anatomia, daí deduziu as atitudes que considerou mais convenientes para um bailarino. Em 1828 complementou seu primeiro tratado escrevendo “Code de Terpsicore1 – Coda de Terpsícore”. Nessa complementação de seus estudos sistemáticos não descartou as teorias formuladas por seus antecessores desde o século XVI, mas propôs modificações nas regras acadêmicas, ângulos mais estéticos, ênfase no emprego do épaulement , além de introduzir a barra como elemento auxiliar nos exercícios preliminares da aula. Teorizou também sobre o sapato de ponta, transformando-se, de acordo com vários autores, no principal pedagogo do Romantismo, já que a necessidade de elevação, ansiosamente buscada na época, passava a ser atendida pelo padrão de beleza estética das bailarinas favorecidas pelo novo acessório.
Daí, para sempre, a sapatilha reforçada na ponta ficou fazendo parte inconfundível da dança acadêmica feminina, estrutura tão nítida dele quanto as gazes e tutus brancos, leves e etéreos que aposentaram os velhos trajes empetecados.
Enrico Cecchetti é um dos maiores mestres italianos de todos os tempos. Produto da herança tradicional daquela concepção de dança, muito virtuosística, e que valorizava muito os saltos e as baterias, herdou também a teoria didático-pedagógica de Carlo Blasis. As formas que utilizou para a execução dos changements, assemblés, fouettés e ballottés hoje denominados simplesmente "italianos", ficaram famosas. Na verdade, seus ensinamentos foram incorporados pelos grandes métodos de ensino da atualidade, sem exceção.
A Escola Francesa
Embora a Itália nunca tenha se perdido do balé clássico, produzindo ao longo da história grande maestros de dança, o gradativo domínio da França se fez óbvio no número cada vez maior de termos em francês. A prevalência desse idioma sobre as demais línguas faladas por povos que praticavam a dança cortesã e depois a dança acadêmica foi inevitável.
Em 1725 o maître-de-ballet Pierre Rameau, que ensinara na corte espanhola, escreveu um pequeno livro intitulado “Le Maitre à Danser – O Maestro de Dança”. Nele, Rameau reafirmava a importância da posição en dehors dos pés e das cinco posições fundamentais da dança acadêmica, passando por um processo seletivo que remontava à Grécia e ao Egito. Os termos já conhecidos apareciam ao lado de outros novos ou já citados. O balé seguia edificando suas bases de maneira tão sólida, que lhe permitiu evoluir, sofrer contestações e mudanças, mas continuar eternamente, ao que parece, uma forma de expressão artística que encantou e encanta o mundo todo, em todas as idades, realizando a sensibilidade de milhares de executantes e espectadores, além de proporcionar um desenvolvimento técnico praticamente insubstituível para a maior parte dos bailarinos e dançarinos em qualquer tempo.
Esse tratado teve a importância considerável de fixar as normas da dança acadêmica em bases sólidas e que vigorariam até o surgimento da figura de Jean-Georges Noverre. Noverre é de importância capital na moderna concepção de espetáculo. Suas concepções básicas foram expostas no livro, denominado “Lettres sur la Danse et sur le Ballet – Cartas sobre a Dança e sobre o Ballet” publicado pela primeira vez em 1760. Entre outras definições de importância encontradas em sua obra escrita, podemos citar:
“(...) A dança é a arte de formar com graça, precisão e facilidade o passo e formar as figuras, e a pantomima é a arte de exprimir as emoções pelos gestos. A coreografia deve desenvolver os momentos líricos da ação, através de uma sucessão de passagens dançadas e da ação dramática exprimida pela mímica(...)”
Admitindo o princípio de que a técnica não é um fim, mas um pré-requisito e um meio necessário, insistiu na obrigação de um forte treinamento para os bailarinos. Seguro e profundo, prescreveu regras para a utilização do en dehors e exercícios próprios para o desenvolvimento da extensão e do alongamento das articulações e dos músculos. Podem ser atribuídos a ele a invenção de tours de jambes en dehors e en dedans e dos ports de bras “sem os quais não se adquire expressão”, afirmava.
A Escola dinamarquesa de ballet: influência da Itália e essência do requinte francês
Legítimo produto das escolas francesa e italiana a escola dinamarquesa teve sua origem em Vincenzo Galeotti. O bailarino e coreógrafo florentino Galeotti foi aluno de Noverre, em Stuttgart, e de Gasparo Angiolini, a quem reconheceu como seu mestre ideal, em Veneza. Galeotti estabeleceu-se definitivamente em Copenhague em 1775, sendo reconhecido como o continuador da linha mais progressiva da coreografia italiana e fundador do ballet na Dinamarca, cultivado até então de forma insegura e com obras sem importância. Galeotti foi seguido pelos Bournonville, Antoine e Auguste, pai e filho, respectivamente. Auguste Bournonville, foi aluno de seu pai, de Galeotti e, na sua juventude, de Auguste Vestris. O estilo acadêmico francês constitui-se na quintessência da linguagem coreográfica de Bournonville e da própria escola dinamarquesa, que se formou e de afirmou sob sua liderança, ainda que sobre as bases já estabelecidas de Galeotti.
No Royal Danish, a dança acadêmica de tradição francesa e de origem italiana sofreu um processo de purificação e de estilização técnico-expressiva na qual Bournonville imprimiu sua própria personalidade, reconhecível em seu equilíbrio e em sua articulada riqueza de composição, em seu nobre e luminoso lirismo romântico distante de qualquer introspecção, concebido com uma sutil claridade feliz e alegre, no cuidado pelo perfeito refinamento na execução de cada passo, valorizado pelo relevo da ½ ponta, pela ligeireza e pela facilidade do ballon carente de qualquer aparência de virtuosismo espetacular.
Reconhecível também na valorização da dança masculina, técnica e expressivamente valorizada, onde se exige domínio absoluto de baterias e de grands jetés e se observa uma menor utilização dos braços, tanto na aula quanto na criação coreográfica, além de um exigentíssimo trabalho de pés. O estilo de Bournonville foi preservado intacto até hoje graças a uma impermeável tradição didática e interpretativa. Através de Christian Johannson, seu aluno, que atuou mais tarde em São Petersburgo, influenciou, juntamente com as escolas francesa e italiana, a escola russa, influência que se refletiu em todo o mundo do ballet do século XX, primeiramente através dos “Ballets Russes de Diaghilev” e mais tarde através do método de ensino de Agripina Vaganova. O célebre crítico Arnold Haskell no seu livro "Ballet" (ps.187 e 188) afirma que o estilo de Bournonville é talvez o mais antigo ainda vivo, a essência do charme francês que se perdeu para a própria França.
O tempo tem se incumbido de celebrizar inúmeros bailarinos de formação dinamarquesa, dentre os quais Erik Bruhn, Harald Lander, Peter Schaufuss, Helgi Tomasson, Ib Andersen, Peter Martins, Johan Kõbborg, entre inúmeros outros. Apesar das bailarinas Kirsten Simone, Toni Lander e Rose Gad, por exemplo, terem conhecido fama internacional, sem dúvida, os homens são superiores.
A Escola russa de Vaganova: requinte francês, virtuosismo italiano e os elementos oriundos do folclore do povo russo
Agrippina Vaganova foi a primeira bailarina a perceber a importância de um programa de ensino. Ao codificar seus “Princípios básicos do ballet clássico”, livro adotado no mundo inteiro, ela não apenas dividiu o ensino em diferentes níveis, como conferiu a cada um deles um programa determinado a ser seguido.
Os programas de ensino funcionam como uma ferramenta guia para o professor e como orientação para estudantes em vias de profissionalização. A organização e progressividade do conteúdo dos diversos níveis de ensino e das aulas diárias são muito bem contempladas nas diversas escolas, revelando a decomposição de cada movimento ou exercício adotado pelo vocabulário do ballet clássico e revelando e registrando para o estudante a lógica de sua construção.
Movimentos como dessus e dessous, freqüentemente traduzidos pelo professor como “para frente – en avant, ou para trás - en arrière” – são esclarecidos dirimindo as dúvidas possíveis. De fato, dessus significa por cima - sobre, e dessous - sob. Exemplificando, o movimento para frente não necessariamente envolve a idéia contida no dessus.
Uma maneira fácil de ensinar o sentido do dessus e do dessous é deitar o aluno no chão e orientá-lo a executar, deitado, a 5ª posição de pés. Imaginando-se a perna direita por baixo da esquerda, pedir ao aluno para passar a perna direita por cima da esquerda, o dessus; o movimento contrário executado com a mesma perna, passando-a por baixo da outra perna, representa o dessous.
Diz Vaganova:
“(...) Os exercícios diariamente ensinados na barra vão, gradativamente sendo levados para o centro. O adágio e o allegro são trabalhos que se seguem nos exercícios do centro. Os bons hábitos adquiridos pelos estudantes nos exercícios devem ser mantidos na prática diária e devem ser baseados em estritas regras metodológicas (...) O trabalho acumulado durante as lições deve ser equilibradamente distribuído por todos os exercícios. Se o professor entender que é necessário, por exemplo, intensificar o número de repetições de certos movimentos, então ele poderá diminuir a quantidade de exercícios seguintes, uma vez que toda sobrecarga de trabalho é nociva e conduz ao enfraquecimento da musculatura e dos ligamentos. Como resultado disso, as pernas podem facilmente serem prejudicadas.”
A seqüência dos exercícios da barra não é determinada displicentemente. É sim, o resultado de um longo curso de desenvolvimento, onde os professores introduzem muitas mudanças e muitas contribuições. Os exercícios executados no centro da sala têm a mesma importância e desenvolvimento dos feitos na barra e sua seqüência é, basicamente, a mesma. Contudo, é consideravelmente mais difícil preservar o en dehors das pernas e a estabilidade do corpo, especialmente na ½ ponta, sem a ajuda da barra.
Os norte-americanos na extraordinária tradução de Balanchine
Faz parte do senso comum afirmar sobre a escola desenvolvida por Georges Balanchine nos Estados Unidos: “Sua linguagem é clássica, seu sotaque é americano.” Realmente, ninguém traduziu melhor em dança o temperamento de um povo do que o fez o russo Balanchine. Todo o sentimento de auto-suficiência e espírito desportista daquela América foi compreendida por ele e expressada em sua escola e sua obra.
Vale observar alguns detalhes de sua aula. O port-de-bras deve apresentar um sentido de liberdade que traduza auto-suficiência e auto-estima. Os braços se cruzam na 3ª posição nos port-de-bras (como se estivéssemos tirando um pullover) e as mãos devem ter permanente flexibilidade. As mãos mostram os cinco dedos de maneira acentuada e devem ser livres na sua movimentação e os grands-pliés sobem de uma vez, sem paradas nítidas no demi-plié. Os saltos devem pousam cuidadosamente no chão e para tanto passam pela ½ ponta. Em todos os movimentos em que o calcanhar tenha saído do chão, ao retornar, ele não deve encostar totalmente no chão.
Essa característica de Balanchine acentua a velocidade da execução dos movimentos e contrasta fortemente com a concepção de Vaganova, em que o demi-plié profundo é acentuado, buscando-se, ao colocar o calcanhar no chão, não apenas alongar o tendão de Aquiles, mas também favorecer a altura dos saltos. Ou seja: o bailarino de Balanchine dança numa velocidade muito superior ao russo; em compensação, o bailarino formado pelo método Vaganova tem saltos muito mais altos, o que, obviamente, exige um tempo maior de execução.
Os quatros arabesques são os mesmos adotados por Vaganova. Contudo, Vaganova não acentua o deslocamento do ombro para sugerir a idéia de oposição, de cruzamento entre tronco e quadris, marcantes no estilo Balanchine. Os cotovelos não devem estar esticados além do limite atendendo assim à individualidade de cada anatomia. A cabeça permanece alta, em postura de auto-estima, e o braço é colocado rigorosamente à frente do nariz. No arabesque o quadril é mantido acentuadamente aberto. O pescoço deve estar natural, sem esforço aparente e a compensação do corpo para levantar a perna não é usada. O eixo central do corpo é sempre a referência da direção da perna e do braço em arabesque. Por isso mesmo, as pernas nas direções devant e derrière são usadas com cruzamento acentuado.
A maîtresse que ilustra as aulas no método de Balanchine chama a atenção para que os movimentos sejam executados pensando-se em cada um no momento em que estão acontecendo. Não se deve sacrificar um movimento em função da dificuldade do movimento seguinte. Os attitudes derrière, na posição effacé, não são tão alongados que formem um ângulo oblíquo como os russos; tampouco são tão encurtados que formem um ângulo reto como os ingleses. O attitude devant deve ser bem cruzado e por conseqüência só será en dehors dentro da medida do sensato e do possível. Antes de concluir esse ensaio gostaria de frisar um elemento muito presente na didática de ensino de Balanchine. Ele usou as aulas para introduzir trechos dos ballets que integram o repertório de sua companhia. Vaganova pouco coreografou, mas ela menciona a importância de serem ensinadas nas aulas trechos de variações de ballets de repertório. Os ingleses adaptaram o ensino do ballet a seu temperamento contido, mas marcadamente dramático, encontrando na sua criação coreográfica sua grande contribuição ao mundo da dança.
A escola cubana, muito mais recente, foi desenvolvida a partir da grande influência que os russos exerceram em seu país, e na experiência pessoal de Alicia Alonso, sua figura mais mítica, nos Estados Unidos como figura principal do American Ballet Theatre. Alonso e uma equipe de mestres da dança, respeitando as características biofísicas do povo cubano, se impuseram ao mundo pela excelência dos bailarinos que produziram em pouco tempo.
Ligações Externas
"La Fille Mal Gardee" na wikipidea
Ver Também
Bibliografia
- BOUCIER, P. História da danca no Ocidente. Sao Paulo: Martins Fontes, 1987.